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segunda-feira, 4 de agosto de 2008

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Perseverar...

Dançou até ser incomodada pelo salto a castigar-lhe os delicados pés. Cedeu à dor e decidiu sentar-se. Vai acontecer novamente - pensou. Cruzou as pernas com leveza e classe, empertigou-se na cadeira, e pôs-se a observar o ambiente. A penumbra que envolvia a festa era dissipada pelos vorazes e ocasionais jatos de luz branca, transparecendo uma inversão de valores em cada lampejo que a atingia. Sentiu-se só. Longe de seu quarto, da companhia plácida de seu lençol e seu caderninho capa dura de folhas com extremidades alaranjadas. Ali, era apenas ela, solitária, enquanto suas amigas engalfinhavam-se pelos cantos com alguém com quem trocaram algumas palavras.
Mariana era uma moça bonita. Os seus olhos de mel harmonizavam perfeitamente com o cabelo loiro que lhe escorria pelos ombros. Os lábios finos e o nariz pequeno e afilado davam um ar angelical àquele rosto cujo olhar poderia enfeitiçar a alma de quem fosse atingido por ele, mesmo que obliquamente. A pele alva salientava bochechas rosadas pela maquiagem bem dosada e a sua boca, matizada pelo gloss, propagava quase tanto brilho quanto seu sorriso.
Mas ela não sorria. Embalada pelo som ritmado das batidas eletrônicas, apenas divagava em sua solidão. Voltava a questionar seus próprios valores e desejos, e sabia que nenhum deles se faria presente naquele lugar. "Idiota!". Não entendia porque sempre insistia em se colocar em situações nas quais já pressupunha o desfecho.
Vinte e um anos e nenhum amor. "Será que minha mãe quebrou três espelhos quando eu nasci?".
Sempre negligenciara os sinais indiscretos que partiam dos homens ao seu redor. Não sentia interesse por satisfações vazias que durariam apenas uma noite.
Ela só queria encontrar alguém para quem pudesse contar suas paranóias de infância. Confessar que não gostava de dormir com os pés desembrulhados ou que sempre teve um pavor horrível a aranhas.
Queria alguém que não servisse apenas para levar às baladas, mas que se dispusesse a ir àquela festa brega de sua tia que mora do outro lado da cidade.
Alguém com quem pudesse discutir sobre banalidades, sem temer passar por fútil.
Não o queria para desfilar do lado, mas para levá-lo dentro do peito.
Nem pretendia usá-lo para ser alguém, e por isso mesmo seria uma pessoa muito melhor.
As horas passearam enquanto ela permanecia imersa em seus pensamentos. O céu salpicou em seu rosto os primeiros sinais do alvorecer. A tímida lua desaparecia levando consigo toda a arenosidade de seu onírico olhar.
No fundo, Mariana sabia que essa pessoa existia e tinha uma intrínseca convicção de que o encontraria.

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