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segunda-feira, 15 de setembro de 2008

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Percepção...

Olhava para o horizonte. O entrançado da rede marcava as suas costas e tudo o que ele queria era contemplar a beleza daquele fim de tarde. O vento e a areia ensaiavam sua dança intermitente, dissolvendo qualquer resquício de cansaço, enquanto o sol se derramava pelas pedras reveladas com a baixa da maré. Sua mente divagava entre lembranças nostálgicas de um passado no qual ele corria à beira-mar, sentindo a areia gelada por entre seus dedos, pisando em conchas e marcando pegadas firmes a cada passo. Já não tinha toda a disposição da infância. Agora, preferia apenas deitar e deixar seu cabelo e sua camiseta balançarem com o vento. Perdeu a noção do tempo, enquanto as nuvens velozes passavam sobre sua cabeça, entrecortando o céu em tons pêssego e baunilha. As pedras já quase desapareciam, lambidas pelas ondas que as esculpiam dia após dia, durante intermináveis séculos. Subitamente, o barulho do vento foi dissipado por uma melodia romântica que provinha de um radinho num quiósque próximo. Willian ouviu atentamente a música já conhecida e: espanto! Não pensara em ninguém. Sempre existia alguém em quem pensava, ao ouvir uma composição romântica. Fosse para especular ouvi-la com tal pessoa, ou para pensar no que ela estaria fazendo no momento, ou talvez, fosse pela necessidade de sempre ter seu coração envolvido em alguma relação impossível com alguma parceira idealizada. Entretanto, naquele momento, ouviu a melodia e até se esforçou para pensar em alguém, mas não conseguiu.
Sentiu-se livre. Finalmente poderia olhar para si mesmo antes de ter ou ser de alguém. Entendeu que de nada adiantara toda aquela obsessão por achar alguém que o completasse, pois não se pode sair à procura do amor. O amor simplesmente nos encontra, seja naquela tarde quente de terça-feira ou naquela noite chuvosa onde nada parece se mover. O amor chega de mansinho e ataca de supetão, põe-se ao alcance de nossa visão periférica, pois sabe que não vai ser notado enquanto estamos com um foco principal. A partir daquele dia, Willian poderia permitir-se viver sem frustrações decorrentes de expectativas desencadeadas por ilusões. Cultivaria seu próprio jardim e teria uma boa colheita a oferecer quando fosse encontrado; fosse numa pacífica noite de outono, ou numa alvoroçada tarde de verão...

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