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sexta-feira, 6 de março de 2009

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Absorto...

A rua ainda estava alagada quando a atravessei, entrecortando carros que faziam lama respingar em meus pés. A chuva, agora tênue, lambia a copa das árvores com a polidez e a cautela de quem leva consigo toda a fadiga da cidade, quase nunca reclamando de seu trabalho.
Cheguei ao canteiro central, que ostentava um semblante harmônico capaz de persuadir qualquer angústia a levantar vôo e não voltar tão cedo. Era um dia calmo e agradável; sobretudo, úmido. Onze horas da manhã, e eu redescobrindo o prazer de perambular entre árvores sorridentes e nuvens distraídas.
Alguns minutos a andar pelo boulevard e eu já alardeava aquele sorriso que só possuem as crianças ou os que se permitem esquecer até dos menores problemas. Passeava tranquilo, com o andar empertigado de sempre, até que, de longe, reparei em uma menina que me observava. Devia ter por volta de seus 7 anos, com seu vestido bege, cabelo amarrado para trás e olhos graúdos. De mãos dadas com quem intui ser sua mãe, ela passou por mim sorrindo, com a boca e com os olhos; talvez por atentar à minha cara de bobo totalmente conciliada com minha roupa molhada e minhas pegadas irregulares. Eram os olhos mais verdes e penetrantes que eu jamais vira.
Retribui o gesto, desconsertado, e detive meu passo por alguns segundos. Debaixo do Oiti, os dedos da chuva me alcançaram com o peso das horas. Por enquanto, aquelas turmalinas brutas carregam a simplicidade da inocência. Mas no futuro, sua lapidação implicará nos mais persuasivos feitiços ou na mais reconfortante consolação.

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